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Orçamento de estado para 2008

bernardino-soares2 No encerramento do debate parlamentar sobre a proposta de Orçamento de Estado para 2008, Bernardino Soares afirmou que este «é o orçamento em que o Governo, com a mais descarada falta de vergonha, vem vangloriar-se de cumprir e imagine-se, até de ultrapassar, os objectivos decorrentes da sua obsessão pelo défice orçamental, quando sabe que com isso provocou o empobrecimento, o desemprego e a degradação da vida da esmagadora maioria dos portugueses. O líder parlamentar do PCP sublinhou ainda que o debate comprovou que a proposta de OE não vai resolver nenhum dos graves problemas do país».

Orçamento do Estado para 2008 (encerramento do debate na generalidade)

Intervenção de Bernardino Soares 

Senhor Presidente,
Senhores Deputados,


Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

O debate na generalidade que hoje termina permitiu comprovar que o Orçamento do Estado para 2008 (proposta de lei n.º 162/X) não vai resolver nenhum dos graves problemas do País.

Não vai resolver o problema do défice estrutural da nossa economia, nem o do desemprego, nem o do baixo nível de investimento, nem o da injustiça fiscal, nem o da injusta distribuição da riqueza, nem o das assimetrias regionais, nem o da continuada divergência com os níveis de crescimento e desenvolvimento da União Europeia.

É o Orçamento em que o Governo, com a mais descarada falta de vergonha, vem vangloriar-se de cumprir e, imagine-se, até de ultrapassar, os objectivos decorrentes da sua obsessão pelo défice orçamental, quando sabe que isso provocou o empobrecimento, o desemprego e a degradação das condições de vida da esmagadora maioria dos portugueses.

Mas este debate teve a virtude de pôr a nu que a imagem de credibilidade e transparência orçamental, de que o Governo e, em especial, o Ministro das Finanças gostam de se arrogar, não existe.

O Governo não deu nenhuma resposta satisfatória à questão da Estradas de Portugal e da sua ausência do Orçamento para 2008. O Primeiro-Ministro chegou mesmo a dizer que a Estradas de Portugal constava da rubrica Fundos e Serviços Autónomos, o que é mentira, como, aliás, confirmou o Ministro das Finanças no dia seguinte.

Sucessivamente questionado, o Governo não explicou qual é o plano de investimentos da Estradas de Portugal e que projectos estão previstos, qual é a despesa com pessoal, qual é o montante com que contribui para o défice esta empresa ou como vai ser financiada, para além da fatia dos impostos que recebe. O Governo quer simplesmente varrer a Estradas de Portugal para debaixo do tapete.

Bem o percebemos.

Como a negociata em preparação é de tal forma absurda e escandalosa, é preciso escondê-la dos portugueses. É preciso esconder a manobra de entrega ao sector privado da rede de estradas nacionais, um monopólio natural, por um prazo até 2099, o único que se conhece até agora, suportada com receitas dos nossos impostos e com a possibilidade de imposição de portagens em itinerários complementares (IC) e itinerários principais (IP). O Governo quer garantir um negócio estável e sem risco ao Grupo Mello para o resto do século XXI.

Entretanto, este ano, também desapareceu do orçamento a REFER, constando as verbas para equipamentos para a infância e para os idosos num insindicável programa PARES, depois de, em anos anteriores, já termos deixado de ter a maioria dos hospitais e, quem sabe, no futuro, as fundações que o Governo quer impor no ensino superior. Por este andar, qualquer ano destes limitamo-nos a discutir as resmas de papel gastas no Ministério das Finanças.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Este é, sem dúvida também, o Orçamento da continuação de elevados níveis de desemprego no nosso país. O Governo reviu em alta as suas previsões para o desemprego, mesmo que procure disfarçar a gravidade da situação com contorcionismos estatísticos, que, aliás, utilizam termos de comparação não homólogos.

Por detrás dos eufemismos da «criação líquida de emprego» ou da «contenção do ritmo de crescimento do desemprego» está uma realidade incontornável: é que o desemprego aumenta e está no mais alto nível das últimas décadas. Mais: ao desemprego junta-se uma crescente precariedade dos vínculos laborais, na Administração Pública e no sector privado, que o Governo pretende ainda aumentar. Mais valia ao Sr. Ministro do Trabalho passar a chamar-se «ministro do desemprego e da precariedade».

O Governo consegue, entretanto, a proeza extraordinária de, aumentando o desemprego, diminuir o número de trabalhadores com acesso ao subsídio de desemprego. Entre Março de 2006 e Junho de 2007, diminuíram em 42 000 os trabalhadores desempregados com direito ao subsídio de desemprego, passando a taxa de cobertura de 57% para 46%, devido à alteração à lei feita pelo Governo PS. É de uma chocante insensibilidade social.

Entretanto, o Governo continua a penalizar os salários dos trabalhadores da Administração Pública, ao aumentá-los em linha com uma inflação prevista que, provavelmente, não será a efectiva, como não foi em anos anteriores. E isto apesar de estes trabalhadores estarem a perder poder de compra há vários anos, cifrando-se aquela em 10% e apesar de o Primeiro-Ministro ter anunciado há umas semanas que, em 2008, começariam a recuperar o poder de compra. Foi o que se viu.

O mesmo se diga acerca dos trabalhadores do sector privado, designadamente no que toca à importantíssima questão do salário mínimo nacional.

O compromisso assumido pelo Governo (o tal que, um ano antes, o Primeiro-Ministro qualificava como irrealista e fantasioso) implica que, já em 2008, a subida do salário mínimo tem de ter concretização proporcional ao que é o objectivo para 2009, isto é, pelo menos metade desse mesmo objectivo.

É preocupante que o Governo não tenha respondido ao PCP, apesar de várias vezes lhe termos feito perguntas sobre esta questão do salário mínimo. Esperemos que não se esteja a preparar para um aumento inferior a 426,50 € para o próximo ano, beneficiando assim o patronato e concentrando meios, também neste domínio, para a campanha eleitoral de 2009.

Este Orçamento continua a ser de gritante injustiça fiscal. Offshore da Madeira, taxa efectiva de IRC da banca, benefícios aos PPR, isenção das mais-valias bolsistas, manutenção do segredo bancário, contrastam com as medidas que o Governo aplica aos reformados e aos cidadãos com deficiência.

E as perspectivas são de agravamento, com a receita dos impostos indirectos a crescer mais do que a dos directos e com o IRS a crescer mais do que o IRC.

Mas onde o Governo mais se «viu em palpos de aranha» neste debate foi na resposta às perguntas do PCP relativas à proposta de baixa da taxa normal do IVA, de 21% para 20%, em 2008, e para 19%, em 2009.

É que nem o Governo nem ninguém podem negar que a elevada taxa de IVA que temos no nosso país é negativa para a nossa produção e para o crescimento do consumo interno; nem o Governo nem ninguém podem negar que, nas regiões do interior, a diferença do IVA em comparação com a vizinha Espanha tem efeitos devastadores na nossa economia; nem ninguém pode negar que se trata de uma taxa que acentua a injustiça fiscal no nosso país.

A proposta que fazemos é, por isso, sem dúvida, boa e necessária para o País.

Mas como já esperávamos que o Governo, na sua obsessão pelo défice, não se compadeceria com as vantagens da proposta do PCP para a economia e para as populações, porque essas não são preocupações fundamentais do Orçamento apresentado, viemos justificar esta nossa proposta utilizando a lógica do próprio Governo.

O aumento da taxa do IVA foi sempre apresentado como transitório, com vista à consolidação orçamental.

É aqui que começam as dificuldades do Governo em justificar a recusa desta proposta. É que, mesmo de acordo com a sua errada submissão ao défice, não há nenhuma razão para não adoptar esta proposta já este ano. A perda de receita fiscal decorrente desta alteração em 2008 manteria o défice abaixo de 2,6% do PIB, que é o único compromisso efectivo com Bruxelas. Não há, pois, nenhuma razão orçamental que impeça a aprovação desta proposta.

Por isso foi tão difícil ao Ministro das Finanças justificar a rejeição anunciada.

O Ministro das Finanças afirmou, na manhã de ontem, o seguinte: «a consolidação orçamental deve prosseguir até reduzirmos o défice para um valor próximo do equilíbrio. O nosso compromisso é o de atingirmos 0,4% em 2010. E até lá não podemos entrar em veleidades de afrouxamento do combate à fraude e evasão fiscais ou de descida dos impostos fora de tempo. Seria irresponsável.» Foi o que disse o Sr. Ministro das Finanças ontem de manhã.

Só que, pressionado pelo PCP - e não pelo PSD, como podiam fazer entender as declarações do Presidente do PSD ontem à noite -, e vendo que a conclusão óbvia destas declarações era a da negação de qualquer baixa da taxa do IVA até 2010, o Ministro das Finanças resolveu tentar emendar a mão à tarde, desdobrando-se em declarações aos jornalistas num estilo hesitante que até não é habitual no Sr. Ministro das Finanças.

Só resta uma razão para esta recusa, a pior de todas: ao desmentir-se a si próprio em relação à baixa da taxa do IVA, o que o Ministro das Finanças veio confirmar foi que o Governo pretende usar essa medida não no momento em que, mesmo na sua errada lógica de obsessão pelo défice, há já condições para isso, mas no momento em que o interesse partidário e eleitoral do seu partido mais o aconselha.

A correcção de ontem à tarde é uma confirmação do golpe. A ser assim, em 2008 não há eleições, e por isso não há baixa do IVA. Em 2009 há eleições, e por isso irá haver baixa do IVA. É um oportunismo eleitoralista que despreza os portugueses e a economia e é uma vergonha deste Orçamento do Estado.

Este Orçamento vai continuar a atrasar o País e a castigar os portugueses, mas serve que nem uma luva aos grandes interesses privados. Subordina o poder político aos interesses do poder económico, contra aquilo que é a obrigação constitucional. Terá certamente a nossa oposição e também a oposição, o combate e a luta de muitos portugueses, de muitos trabalhadores, que cada vez menos acreditam e aceitam esta desastrosa política do Governo do PS.